sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

"Carnaval, carnaval, carnaval...eu fico triste quando chega o carnaval..."

Gostaria de tecer alguns comentários, mas estou chateada...pensei em algo que pudesse transmitir o que estou sentindo e lembrei do texto do meu amigo nêgo...aí vai...
Orgulho pernambucano
Fácil ver nas ruas camisas com a bandeira de Pernambuco. Orgulho. Por todos os lados hinos e estampas que nos remetem à história. Palavras com sotaque ríspido: sempre prontas para combater o preconceito do Sul. Estamos cientes de nosso espaço e do poder de nossa cultura. Diante da certeza inequívoca de nossas virtudes seríamos, portanto, um exemplo de sociedade justa e que valoriza intermitentemente a sua história? Não.
Pernambuco é incapaz de preservar seu arquivo público: as traças reinam na terra dos leões. Os pernambucanos guardam, por vezes com um sarcástico orgulho, índices de violência e desigualdade alarmantes. A economia do referido Estado permanece praticamente estagnada durante décadas (no que se refere à participação do Estado no PIB nacional). Prefere-se, por aqui, a faca ao diálogo. Mata-se compulsivamente e, preferencialmente, os que não podem se defender. Resta saber: qual o motivo do nosso orgulho?
A cultura. A força das palavras proféticas e conservadoras de Ariano Suassuna que nos incita o orgulho ao dizer, entre outras coisas, que a música pernambucana - sobretudo popular - é infinitamente superior à música norte-americana. O frevo e seus múltiplos passos, domesticados por Nóbrega para exportação. A produção de esculturas de barro como única fonte de renda de cidades como Tracuanhém. O português gostoso e popular, errado, do ponto de vista da norma culta, fruto da falta de escolarização. Resta-nos a pátina sobre os nossos velhos problemas que reveste de cultura a miséria e desigualdade do Estado de Pernambuco.
Não, não devemos mudar a paisagem bucólica e árida do Sertão sob pena de descaracterizar nossas raízes. Os maracatus e a realidade invariavelmente pobre da Zona da Mata - não menos pobre com a bolsa fornecida para os mestres daquele ritmo - devem ser mantidos sem qualquer divórcio. Bom mesmo são as ruas sem asfalto, com árvores tombadas no Centro, nostálgicas (lembremos de algumas ruas em Casa Forte). Melhor é preservar intacta as feiras populares e sua falta de organização que as torna cult.
Diante de nossa miséria, o refrão da cultura que orgulha e silencia nossos problemas por ostentar-nos como diferentes, embora sejamos iguais à parte substancial do Brasil, portanto, miseráveis. Natural perguntar se o orgulho de nosso Estado não é a origem de nossa miséria, senão o entorpecente que nos dificulta a mudança. Em Pernambuco a tradição vence sempre a modernidade e nos condena ao passado, incorruptível porque intangível.
Érico Andrade
Publicado em 03.01.2008 - JC

2 comentários:

Kali disse...

Não conhecia este texto, e fico abosulamente estupefata ao lê-lo!!
Meu deus! Quanto disso sinto diariamente e não sabia expressar!
Perfeito!
O Leão do Norte é manco, cego de um olho e não consegue mais rugir... mas mantém o ar e a pose de rei... um rei falido!
Lembrei-me do adesivo nos carros: "modéstia à parte, sou recifence!" ... é isso aí!

Sheila Bezerra disse...

Valeu pelo comentário Kali. O Nêgo se garantiu mesmo.
Abraço grande, Sheila.