segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Eu não me sinto contemplada no TODOS, e aí? – Quando o politicamente correto é chato, mas não é besteira!

Na última sexta-feira foi encerrada automaticamente (por mim teria deixado mais tempo) a primeira enquete do meu blog. Eu pretendo continuar utilizando desse recurso interessantíssimo com o propósito de interagir com as pessoas e, ademais, fazer uso de seu argumento para, ao final, elaborar algumas palavras sobre o tema em questão. Pois bem, o tema da enquete encerrada se referia à utilização de “todos e todas” nos discursos. Mais especificamente a questão foi: “Você acha que utilizar todos e todas nos discursos é besteira porque...” e as opções que se seguiram para a votação foram: 1) Porque todos é a regra da língua portuguesa e ela não é sexista”; 2) Porque o termo todos já contempla o sexo feminino e não há motivos para mudar e, 3) Não acho. O que é naturalizado dificilmente é questionado.
É claro que essa enquete teve o objetivo de, muito mais, fazer refletir e provocar (como serão as próximas) do que, propriamente, me utilizar do resultado para algum fim sócio-antropológico. Nossa língua portuguesa, assim como a francesa, a espanhola e outras que não saberia precisar aqui, elaboram sua formação no plural a partir do sujeito masculino, e essa não é uma mera coincidência.
Nossa linguagem é um espelho do que somos. Os discursos que utilizamos são frutos de relações de poder que estão nas bases de nossas relações sociais e que têm se construído por meio de, pelo menos, três esferas das desigualdades sociais estruturadas a partir dos seguintes elementos: classe, gênero e raça. Como já dizia meu amigo John e minha amiga Yoko: “Woman is the nigger of the world (...) woman is the slave of the slaves”, e é por isso (por tal constatação) que é sobre a esfera de gênero que me detenho aqui, nesse - como diria uma amiga – “singelo” espaço de reflexão.
O confinamento das mulheres no espaço privado, durantes séculos, retirou delas a possibilidade de falarem por si, entenderem e intervirem nos aspectos simbólicos e materiais de suas próprias vidas. A ciência, a religião, as artes, assumiram a condição do UM masculino e universalizante, e relegaram à condição de OUTRO tudo que não fosse homem, branco, europeu e por aí vai...
Por que estou falando tudo isso? Porque hoje eu e tantas outras mulheres têm consciência de todo esse processo de exclusão ao qual mulheres de todo o mundo foram e têm sido submetidas, e, por isso mesmo, já não nos sentimos contempladas no termo todos. Desejamos que o social, naturalizado a partir das diferenças biológicas, venha a ser desnaturalizado e, mais que isso, que essa coisa “politicamente correta” possa até continuar a ser vista como chata (pq é chata mesmo), mas como besteira jamais (ou pelo menos, até que se torne realmente uma besteira).
Certo dia, estava eu numa defesa de dissertação no mestrado de filosofia da UFPE e o foco era Hannah Arendt. Os examinadores eram um filósofo marxista e um cientista político. O orientador um filósofo também. O cientista político começou sua fala dizendo: bom dia a todos! Parece-me, não tenho certeza, o orientador falou algo em relação à necessidade do “todas” na fala, e então o cientista político disse o seguinte: “esse negócio de politicamente correto é uma besteira, vocês não acham não?” O filósofo marxista concordou de pronto. Parece que o outro hesitou, não sei, mas também não argumentou a favor da “causa”.
É claro que até o final da defesa, outras coisas do tipo rolaram, sabe né...Hannah Arendt, Heidegger, Floresta Negra, claro que a conversa foi parar em Simone de Beauvoir, Sartre...”, não sei como não chegou em Lou, Nietzsche, Romeu, Julieta, Shrek, Fiona, enfim... Voltando à chatice do politicamente correto, sabem quando vai ser besteira? Ou sabem quando acho que realmente será uma besteira? Quando aqueles dois senhores (os três seria melhor, não houve posicionamento do terceiro), é...aqueles...o filósofo marxista, o outro filósofo e o cientista político, eles mesmos..., só considerarei besteira quando eles estiverem num auditório, numa defesa de dissertação sobre, sei lá...Santo Agostinho, Nietzsche, Heidegger, Sartre, tanto faz, são todos machistas mesmo (calma filósofos/as de plantão!) e se sentirem realmente contemplados, do fundo de seus corações filosofantes, quando a palestrante pronunciar um caloroso: “Bom dia a todAs! Quero mesmo ver...
Bem, meu propósito, como disse antes, não foi uma análise estatística do resultado da enquete, mas posso dizer que d@s 12 heróic@s votantes, 66% (8 pessoas) não estão satisfeitos com essa forma masculinizante de universalizar o plural e votaram na opção 3, ou seja, não estou sozinha e isso foi comprovado cientificamente (hehehhe) no meu blog.
Depois falo mais sobre essa chatice do ser politicamente correto, do uso do @, das outras buscas por uma linguagem diferente e não sexista, enfim...mudando o foco, a próxima enquete será sobre mulher e poder. Se puderem, quiserem, desejarem, se sentirem atraíd@s, fiquem à vontade para votar. Eu agradeceria muitíssimo a participação.
Abraço grande e uma ótima semana para tod@s,
Sheila.

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